Dançando conforme a música ou cantoria que são a bola da vez na sinuca televisiva, nas instalações elétricas verde-amarelas igualmente se prioriza a apresentação, buscando-se os elogios das visitas ante os adornos em nossas casas.
Girando feito bailarinos, rodopiamos com os amigos e amigas pelos cômodos do nosso orgulho caseiro enquanto em dó maior exaltamos aquela textura lá, em fá menor essa sanca aqui, e em sol-lá-si aquele estuque ali.
Esperamos ansiosos que a visita saque logo o celular, e dizendo que vai mandar fazer do mesmo jeito na sua casa, fotografe feito paparazzi o nosso surrealista teto de gesso rebaixado da sala, com sua iluminação indireta escondida nos ângulos losangos hexagonais com ar de imóvel de design futurístico.
E o espléndido painel de imitação de madeira de cedro introduzido como suporte da imensa televisão? E os balaústres da sacada ou varanda dando um toque à francesa? E as bancadas e armários planejados da cozinha, de dar inveja ao estúdio do programa da Ana Maria Braga?
As dezenas de luzes que somente são acesas na ocasião da massagem em nossos egos (nas festas, comemorações e ao receber visitas) e outros adereços gesseiros complementam a nossa art decó, merecedora até de ser mencionada em entrevista em sala de estar de gente fina, da alta soçaite.
Tudo muito bom, muito bonito e chamativo. Tal qual palco de espetáculo e obra de político, muito se investiu no que se pode ver, desprezando-se a estrutura elétrica oculta nas paredes e tetos.
Os pontos originais da distribuição da fiação nos tetos, que têm como acabamento para tamparem o aglomerado de fios elétricos as próprias luminárias, encontram-se agora em local incerto e não sabido, em algum ponto remoto encoberto pelos novos tetos de gesso.
Ignorando toda e qualquer lei de normas regulamentadoras também os pontos de distribuição da fiação enlaçados às tomadas foram tampados ou se encontram em local não de difícil, mas de impossível acesso, emparedados por placas de drywall.
Alguns milhares de reais deram visão à beleza exterior das paredes, empregados na ocultação dos emaranhados de fios feios que a seu tempo cobrarão a sua mágoa pelo desprezo.
Sofrendo ao longo do tempo a imposição da “gravidade”, como em cirurgia plástica numa garota de 80 anos, os problemas elétricos depois de um tempo darão as caras pois a troca da fiação não foi sequer cogitada na reforma geral.
Besteira gastar dinheiro com isso, foi-se adicionando lâmpadas e equipamentos de grosso calibre, e se por um acaso viermos a ouvir o som do estouro de algum curto-circuito neste país violento, eventualmente estremeceremos indagando: Que tiro foi esse?
Acontece que em muitos imóveis reformados de hoje em dia a coisa está sendo toda tão bem feita que a colocação de novas fiações em diversos pontos das residências retrocedeu a décadas de anos atrás, quando os fios elétricos não tinham tubulações para os acondicionar, sendo depois de ligados, sepultados com cimento ou gesso para sempre.
Parece um absurdo, mas é normal e adequado aos prestadores de serviços atuais entrarem em cena travestidos de eletricistas, encanadores, pedreiros e pintores; os conhecidos faz-tudo da vida.
As pessoas adoram; os chamam de polivalentes, pau-pra-toda-obra. Acham admirável o fato destes indivíduos terem adquirido o conhecimento do que fazem na escola da vida, não em livros de escola.
Não se pensa que amanhã ou depois precisaremos de puxar uma nova fiação para um moderno chuveiro ou aparelho de alta potência, não se raciocina que os pontos de distribuição que estão sendo tampados não são só lugares da fiação no imóvel, mas também pontos de inspeção indispensáveis para a localização de defeitos que vierem a ocorrer futuramente na instalação elétrica.
Nem dormindo com o perigo se pressupõe que a troca dos disjuntores que começaram a cair depois da obra por outros mais fortes representa um risco de vida iminente através do superaquecimento da fiação pós-reforma, obrigando os disjuntores antigos a desarmarem.
De vez em quando chego em endereços dos quais retorno sem fazer nada, pois as pessoas desconfiam da minha capacidade diante da declaração de que se terá que quebrar tudo e fazer de novo, para que se possa ter acesso à distribuição elétrica do imóvel.
O cliente imagina que alguma coisa de ruim aconteceu à pessoa que reformou a sua casa, devendo-se a isto o fato dela não atender suas ligações ou ter desaparecido do número de telefone que deixou.
“Se” conseguisse falar com aquele verdadeiro profissional, tudo seria resolvido rapidamente, e sem quebrar nada.
Compartilhe
Deixe a sua avaliação